terça-feira, 22 de julho de 2014

Os Dez Mandamentos (The Ten Commandments, 1956)


Há filmes que você não apenas assiste, mas faz quase uma opção de vida. Seja pelo tema, seja pela duração, seja pela imersão histórica que proporcionam. Houve um tempo no cinema que uma "superprodução" só era considerada como tal se tivesse esses três componentes: longa duração (longa mesmo, estou falando de no mínimo 3 horas aqui), temas grandiosos e imersão histórica (traduzida em altos orçamentos com locações, figurinos, além de grandes atores). Hoje a palavra perdeu um pouco do sentido original, mas foi a era dos ÉPICOS. Cineastas como Cecil B. DeMille, David O. Selznick, David Lean (de quem já falei em Doutor Jivago) em um dado momento (mais notadamente, as décadas de 40 a 60) se especializaram nesse tipo de filme, que até hoje povoa as reprises noturnas.

Pois foi ontem, em uma dessas reprises, que me deparei com Os Dez Mandamentos. Estava para começar, eu nunca tinha visto, e tudo que ele exigia de mim eram quase 4 horas de dedicação, abrindo mão de parte do meu sono. Era uma proposta tentadora demais.


Apesar de não ser religioso, conheço um pouco da história da Bíblia, ainda mais essa que é uma das passagens mais importantes do Antigo Testamento. Minha primeira surpresa foi perceber que, apesar de seu nome, o filme cobre muito mais do que a entrega das tábuas da lei por Deus a Moisés, cobrindo praticamente toda a sua vida. E o mais interessante é que a parte que mais gostei do filme é justamente o início, que conta desde seu nascimento até a descoberta de que ele é hebreu e consequente expulsão do Egito.



Nessa fase do filme, há de se destacar também um outro aspecto fundamental dos épicos dessa fase: a canastrice das atuações. Um filme de 3, 4 horas de duração não pode se dar ao luxo de "barrigas" muito longas, aquelas sequências de cenas em que o ritmo do filme cai. Assim, todo diálogo, toda cena tem que ser, também, épica. Isso favorece, e até pede, atuações e diálogos que tragam essa "grandiosidade" da produção em cada take. Portanto, os atores acabavam sendo meio "exagerados". Para mim, Yul Brynner, no papel de Ramsés II, personifica bem esse estilo de atuação, com seus trejeitos e impostação de voz. Há de se considerar a época e o filme, mas hoje em dia soa quase caricato. Charlton Heston tem, claro, o papel de sua vida como Moisés, que, por força da própria história, acaba sendo um personagem um tanto unidimensional, ainda mais em sua fase profeta. Quem me surpreendeu foi Anne Baxter, no papel de Nefertiri, futura esposa do faraó. Seu papel se encaixa um pouco na "sedutora vingativa" de A Malvada, mas ela é, pra mim, o destaque do filme em termos de atuação.


No mais, um épico como um épico deve ser: atores de destaque até em papéis secundários (até Vincent Price está no filme), locações grandiosas (parte do filme foi feita no Egito), cenas ambiciosas. Aliás, como disse acima, esperava um filme que falasse mais da peregrinação dos hebreus, e essa parte é tocada bem por alto na história, culminando apenas com a cena mais famosa do filme, a abertura do Mar Vermelho, um feito notável pela tecnologia de efeitos especiais da época (e risível hoje, claro). Não há muito o que dizer sobre a história, o "roteiro original" é uma história de milhares de anos e que se supõe literal, e adaptar uma história em 4 horas de filme não exige lá grandes soluções inventivas de roteiro.



O que acho mais interessante em assistir filmes antigos é entender o que se entendia na época por "contar uma história". Com a introdução primeiro do som, e depois da cor, no cinema, os diretores se sentiam compelidos a (e capazes de) contar grandes histórias. E faziam isso da maneira mais épica possível. Em tempos de "remakes" e de medo de espantar o público se o filme passa de 2 horas, tem um quê de "volta às origens" sentar na frente da TV e dedicar 4 horas (que, por sinal, passaram bem rápido) a uma história, por mais datada e piegas que ela soe hoje. Só isso já valeu as horas de sono perdidas.

Nota: 7,0